quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

PRECONCEITO LINGUÍSTICO


Marcos Bagno fala muito bem acerca do que se refere ao Preconceito Linguístico. O Curso ministrado pelo CFORM/UnB – Fascículo 5 tem uma história interessante que vale compartilhar, não chega a ser uma aula, mas uma lição de como repensar nossas atitudes enquanto educadores.

Retratos de sala de aula

Numa escola de periferia de uma grande cidade brasileira, a avó de um aluno aparece à porta da sala de aula, meia hora antes do final do turno, e se dirige nestes termos à professora:
“- Dá licença, dona Cráudia, meu nome é Regina, eu sou avó do Pedro. Me perdoa por atrapaiá a aula, mas é que o Pedro tem hora marcada agora no médico, lá no Hospitá das Crínica. Tem dois mês que ele ta se quexano dumas dô no juêi, umas dô que apareceu depois dum jogo de bola, e nós só conseguiu marcá pra hoje de manhã. Esses menino vive dano trabaio pra nós, num é? A mãe dele pediu pra mim levá ele, porque nem ela nem o pai dele não pode largá o serviço.
A professora faz um gesto de permissão com a cabeça, o aluno se retira com a avó. Depois que eles se afastam, a professora se volta para a classe e diz:
- Viram por que vocês precisam vir pra escola? É pra não falar tudo errado feito a avó do Pedro.”

Quando um brasileiro morador de zona urbana e com alto nível de escolarização escuta outra pessoa falar de um modo parecido com o de D. Regina, a reação mais provável é pensar que essa pessoa fala “tudo errado”.
Essa reação, esse tipo de julgamento, acontece em todos os lugares do mundo, em todas as comunidades lingüísticas. Em qualquer sociedade humana, existe sempre um grupo de pessoas que acredita que seu modo de falar é mais “certo” que o dos outros grupos que compõem aquela sociedade.
Durante muito tempo (e em boa medida, até hoje, como nos mostra a reação da professora de Pedro), o ensino de português no Brasil foi orientado por esse jeito de ver os fatos de língua, por essa crença na existência de uma única “língua certa”, usada por uma minoria, que se destaca da massa dos que “falam tudo errado”. Felizmente, nos últimos anos, essa concepção de língua e do papel da escola vem passando por mudanças importantes e positivas, graças ao trabalho dos pesquisadores que se dedicam ao estudo das relações entre língua e sociedade e à investigação do impacto dessas relações nas práticas pedagógicas. (Alfabetização e Linguagem – Fascículo 05, pág. 8)

Diante de tais considerações fica a rica lição que a professora do Pedro teve em poder desmistificar o preconceito lingüístico, podendo salientar que o indivíduo pode interferir no contexto por intermédio do letramento (a leitura do mundo). Que o alfabetizado lê ou ”junta letras”, mas o letrado transcende as letras, não precisa, necessariamente, dominar a língua padrão.
O papel da escola e do professor não é estabelecer noções de ‘certo ou errado’, nem substituir o vernáculo por uma norma culta, mas dar outras oportunidades de manifestação da língua, grande prova disso é a oportunidade de estudar literatura de cordel, Patativa do Assaré e outras tantas formas de cultura da nossa rica língua.
A forma como o aluno se expressa deve ser cuidadosamente respeitada pelo professor, pois isso pode gerar constrangimento e criar uma barreira para o resto da vida acadêmica.
“O caminho é um só, o que muda é o jeito de caminhar” e a maior lição é dar ao nosso aluno a oportunidade de ascender socialmente e ser uma “ferramenta” para um mundo melhor.

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